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quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Os cantos das janelas do kitnet minúsculo da amanda eram cheios de teias de aranha e sujeira porque ela nunca abria a janela toda. Não gostava muito do dia e estava particularmente odiando aquelas manhãs de verão, calor, chuva, calor, corpos bronzeados, barrigas de tanquinho, calor, suor. Não saía de casa de dia. Não precisava, só conseguia clientes a noite. E quando tinha que sair, se enchia de protetor e umas roupas quentes pra cobrir cada centímetro de pele, por isso tinha uma cor cinza meio esquisita de doença, e por isso também, perdia muita gente pras concorrentes bronzeadas com marcas de biquinis.
Amanda tinha uma filha, mas abandonou quando nasceu e foi a coisa mais difícil que ela já fez. Sempre usava batom vermelho. A coisa mais cara que ela tinha era uma bota de couro sintético que ela não usava pra trabalhar. Ela gostava de azul. Tinha aids. Gostava de margaridas mas achava que não era digna de ter margaridas em casa, que não era nem justo torturar flores com aquele cheiro ácido e aquele apartamento ridículo e triste. Sábado passado tinha ido num parque e ficado horas sentada na frente de um canteiro de margaridas no sol, estava queimada e descascando e teve que baixar o preço da foda naquela semana. Um dia desses ouviu uma gargalhada e pensou que era a filha dela. Nunca soube se era mesmo. As vezes ela tinha pesadelos com bebês a acordava com a mão na barriga, e chorava, chorava, chorava.